Nêmesis |
No céu
um pequeno ponto negro surgiu e vagarosamente foi tornando-se maior e maior à
medida que se aproximava do solo. Então uma nuvem tenebrosa encobriu a formosa
dama que sucumbia. De dentro da nuvem, uma voz doce, porém potente como um
trovão, clamou:
-Μαρθα, Μαρθα [1], o que
estás fazendo? Acreditas mesmo que encontrarás justiça na morte?
Inconsciente,
permaneceu indiferente.
De
dentro da nuvem, os contornos de uma mulher se definiam. Seu rosto possuía
traços suaves, quase angelicais, mas seu olhar era severo como de um juiz. Uma
espada em sua mão direita e uma ampulheta na esquerda. Um par de asas a
mantinha suspensa a 2m acima do solo. Provavelmente se tratava de algum Djinn.
-Quem
és tu? – Perguntou a dama.
-A
pergunta é: quem és tu, Μαρθα?
-Eu
sou Marta Médici.
-Quem,
verdadeiramente, és tu, Μαρθα?
-O que queres de mim?
-Devia se perguntar o que posso te
oferecer.
-Eu
não compreendo. Quem és tu? – Perguntou novamente.
-Já
fui chamada de “A Inevitável”, “Indignação”...
Ao dizer isso uma áurea vermelho-acinzentada ofuscou
seus olhos.
-Já fiz reis poderosos se curvarem, já
humilhei soberbos e altivos.
Ao dizer isso, os olhos de Marta Médici se
arregalaram. Tomada de pavor exclamou: -Não pode ser! A senhora é...
-Eu sou “A Vingança”. Eu sou Νέμεσις [2], eu sou
Nêmesis!
Após alguns segundos de silêncio, prosseguiu:
-Não temas, Μαρθα. Há muito tenho te
observado. Seu senso de justiça, sua indignação com a hybris que tomou conta de Florença. Bem aventurada és tu, Marta
Médici.
-Ainda não compreendo. − Os olhos da jovem estavam
banhados em lágrimas.
-Me refiro a seus sentimento por Arthuro Ricardi.
-Aquele
Ricardi arrogante. Ele nem sabe que eu existo... Mas que importância isso teria
para a senhora?
-Ninguém.
Ninguém pode ser tão bonito, tão rico e tão nobre impunemente.
Agora
os olhos de Marta Médici estavam cheios de esperança.
- Μαρθα, se
tivesse que escolher entre vossa própria felicidade ou vingar-se de Arthuro
Ricardi, o que escolheria?
Marta olha para o horizonte. Hesita um
pouco, mas corroída pelo ressentimento dá a resposta que mudará para sempre sua
vida.
-Eu
escolho a vingança.
Nêmesis
esboçou um leve sorriso cúmplice.
-Pois
que assim seja. Erga-se Μαρθα, enxugue
essas lágrimas e assuma seu destino.
Marta
Médici se colocou de joelhos enquanto a deusa pagã declamava:
Tudo que se eleva acima
da sua condição, tanto no bem quanto no mal, expõe-se a represálias dos deuses.
Tende, com efeito, a subverter a ordem do mundo, a pôr em perigo o equilibrio
universal e, por isso, tem de ser castigado, se se pretende que o universo se mantenha como
é [3].
Então
um raio atingiu Marta Médici bem no umbigo que a deixou desacordada. Passado
algumas horas recobrou a consciência. Estava curada. Sem nenhuma cicatriz, mas
em volta de seu umbigo, uma estranha inscrição, uma marca que para sempre a
lembraria quem realmente era...
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[1] Marta em grego.
2 comentários:
Doutor Hugo!! Que postagem é essa rapaz!!
Excelente texto, uma fineza impressionante. Cada vez mais essa simpatia pela vítima, como que preenchendo tanto o trágico quanto o remorso pela destruição de uma vida. Brilhante a escolha de Nêmesis como avatar da Ksirafai. E esse negócio de crise amorosa é plenamente compatível com a inveja da prima mais velha da Aurora.
De onde saiu aquela citação pagã? E esse umbigo com o símbolo Ksirafai? Como foi feito!
Uma das suas melhores postagens, sem sombra de dúvida.
Oi Diego, fico feliz que tenha gostado. A citação eu encontrei na wikipedia, vou colocar a citação no texto.
O umbigo com o símbolo da Ksirafai fui eu quem o construiu no powerpoint.
Um grande abraço,
Hugo Marcelo
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