“(...) Oh Allah! Faça a Terra espaçosa para ela em ambos os lados e eleva sua alma para ti. Oh Allah! Perdoe-nos, perdoe-nos” [1].
Nunca foi tão doloroso entoar esta Duas. Aos 13 anos de idade já havia acompanhado outros sepultamentos, vidas ceifadas pela peste ou pela guerra, mas a dor da morte inesperada de minha mãe era quase insuportável. Na minha mente apenas uma pergunta: Por que? Mas no meu coração um emaranhado de sentimentos: do cinismo à comiseração, do ódio à ternura, culpa e auto-piedade, um verdadeiro sirocco de emoções bestiais, como um leão selvagem faminto a vagar pelas savanas. Pensava “Allah (swt[2]), se é de tua vontade de que um homem se case e tenha filhos, por que minha mãe morreu durante trabalho de parto? Por que Allah (swt) permitiste que o ventre de minha mãe se tornasse o túmulo de meu irmão ainda não nascido?”
Tomado pelo desespero, prostrado, minhas lágrimas caiam ao solo. O mesmo solo que agora velava o corpo de minha mãe e de meu irmão. Neste momento, percebi que uma mão descansava sobre meu ombro. Seus dedos queimavam como brasas, mas era como se queimassem não a minha pele, mas a minha alma. Antes que pudesse esboçar qualquer reação, inexplicavelmente uma serenidade começava a brotar em meu coração, uma paz diferente de tudo que havia experimentado até então irrompia. De forma absolutamente incompreensível para mim, foi como se minhas emoções estivessem sendo reordenadas. Não sei exatamente quanto tempo se passou, ou melhor, foi como se o “tempo” perdesse o significado, como se passado-presente-futuro não existissem.
Com o silenciar de minha (confusa) razão, pude escutar o vento do deserto. O som provocado pelo ar ao tocar aquele mesmo solo que guardava minha mãe, sussurrava de forma doce, porém incessante: Al Mujib[3]... Al Mujib... Al Mujib... Al Mujib...
Sim, Allah (swt), és Al Hakim (O Sábio) que detêm todas as respostas, mas és também “A Resposta”. Neste momento, foi como se adquirisse a potencialidade para assimilar a realidade da morte. Compreendi de uma forma profunda que Allah (swt) é Al Muhyi (o Doador da Vida) mas também Al Mumit (O Criador da Morte, O Destruidor). Este dia foi o mais importante de minha vida, foi o dia em que deixei para trás todo resquício da infância e me tornei verdadeiramente um homem, um servo de Allah (swt).
[1] TALQEEN: oração islâmica (Duas) recitada durante o sepultamento de uma mulher islâmica.
[2] Subhanahu wa ta’ala: “glorioso e exaltado é Ele”.
[3] Al Mujib é um dos “99 nomes de Allah”, dentro da tradição islâmica é um dos atributos de Deus que significa “O que Responde”.
6 comentários:
Obrigado Diego,
Pretendo escrever um Cap. por sessão de jogo... Vamos ver se consigo...
Um grande abraço,
Hugo Marcelo
Oi Diego,
Bolsa-prelúdio... Humm
Já sei como irei me tornar um magus poderosíssimo... Hehehehe
Um grande abraço,
Hugo Marcelo
Adorei as citações!!!
Cadê a continuação, hein???
Curiosa...
Beijinhos!
Camila
Oi Camila,
Vou tentar escrever um capítulo por sessão de jogo...
Fico feliz que tenha gostado,
Hugo Marcelo
Mas esse servo de Allah é um poeta? Um literato? Muito bom o texto... Parabéns!!!
Obrigado Carlos,
Na verdade ele é um MAGO... Hehehe
Um grande abraço,
Hugo Marcelo
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